A manhã da sexta-feira, 3 de março, foi profícua no TJMG para quem se interessa pelo fenômeno do superindividamento, um processo de cumulação de dívidas que leva milhões de pessoas, em todo o mundo, à falência econômica e, muitas vezes, à perda da dignidade. A Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes transmitiu webinário com o tema “Superendividamento (Processual e Pré-processual)”, desenvolvido em parceria com a Terceira Vice-Presidência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG). O conteúdo está disponível no canal da EJEF.
A mesa virtual foi presidida por Desembargador Oliveira Firmo, membro do Comitê Técnico da EJEF, que representou Desembargador Renato Dresch, Segundo Vice-Presidente do TJMG e Superintendente da Escola Judicial. Da mesa também participaram: Juizes Clayton Rosa de Resende e Juliano Carneiro Veiga, Promotor de Justiça Glauber Tatagiba, Procurador de Justiça Leonardo de Medeiros Garcia e Luiz Fernando Perez, economista e perito judicial.
Ao abrir a ação educacional, após as boas-vindas a docentes e discentes, Desembargador Oliveira Firmo destacou a importância sociojurídica do tema e pontuou: “agradeço a todos por mais essa parceria com a EJEF, a qual nós reputamos ser um assunto muito importante por trata-se de algo que está afeto a toda a sociedade, tanto para o indivíduo quanto para as empresas”.
Os debates foram mediados por Marcus Vinícius Mendes do Valle, Juiz auxiliar da Terceira Vice-Presidência, que iniciou sua exposição agradecendo à Desembargadora Ana Paula Nannetti Caixeta, Terceira Vice-presidente do TJMG, pelo apoio e incentivo para que os estudos sobre superendividamento sejam incorporados ao dia a dia da prática jurisdicional, com compreensão de suas consequências e aplicações .
Leonardo de Medeiros Garcia, Procurador do Estado do Espírito Santo, discorreu sobre as competências e atuais jurisprudências relativas ao assunto. Em seguida, explicou dimensões e consequências do superendividamento que são objeto de tratamento judicial e extrajudicial, no âmbito dos Procons e das Defensorias Pública. “Ainda é um tema que necessita de um tratamento judicial uniformizado. Estamos falando de parte significativa da população brasileira que sofre com o superendividamento”, ressaltou.
O procurador compartilhou a experiência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), que criou uma vara judicial virtual especializada para ações relativas ao superendividamento.
O Juiz Clayton Rosa de Resende demonstrou o papel dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos nos processos de superendividamento, esclarecendo como se dá sua atuação nas fases processual e pré-processual. Também destacou o modo como tem ocorrido a conexão com o Núcleo Integrado de Atendimento ao Consumidor (NIACON), fruto de uma parceria entre o Procon-MG/MPMG, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, a Defensoria Pública e a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH). Ao falar da distribuição processual, ele frisou: “Nós temos que separar bem esses momentos. Temos percebido que alguns advogados já estão entrando direto com o processo nas varas cíveis. Com isso, há confusão da forma procedimental e de como deve o ocorrer o tratamento dos casos”.
O magistrado esclareceu que o Núcleo Integrado tem operacionalizado o atendimento pré-processual aos consumidores, realizando, dentre outros procedimentos, a triagem para verificar se a questão se enquadra no conceito de superendividado, pois, se for esse o caso, ele participa, ali mesmo, de uma audiência com os credores e, uma vez obtido o acordo, o documento é encaminhado ao CEJUSC.
Juiz Juliano Carneiro Veiga descreveu como ocorre o atendimento na Comarca de Muriaé, sob sua responsabilidade, e fez uma profunda explanação sobre os fundamentos legais para a aplicação do conceito de superendividamento e do tratamento judicial dos casos, nos mais diversos âmbitos. Ele apresentou dados da Confederação Nacional do Comércio de Bens e Serviços (CNC) que revelam o superendividamento de 79% das famílias brasileiras; também apresentou o “mapa do Serasa” em se aponta inadimplência de 70,09 milhões de brasileiros, o que representa 43,13% da população do País. O magistrado destacou a necessidade da política autocompositiva e de maior atenção à disciplina da prevenção e do tratamento ao superendividamento. “Penso que o momento é de sensibilização de todos os atores que atuam no sistema de Justiça. Estamos caminhando para dois anos que a legislação alterou o Código de Defesa do Consumidor (CDC) e trouxe a disciplina de tratamento e prevenção ao superendividamento e, até agora, vários estados [da federação] pouco caminharam para dar concretude à nova legislação”, pontuou.
O Promotor de Justiça Glauber Tabagiba, coordenador do Procon Estadual, explicou como funciona o Programa de Atendimento ao Superindividado (PAS), destacando tratar-se de serviço gratuito, destinado a auxiliar as pessoas a recuperarem o crédito e quitarem suas dívidas, que é oferecido no Núcleo Integrado de Atendimento ao Consumidor (NIACON), por meio de cooperação entre Ministério Público, TJMG, Defensoria Pública e outras instituições. Como gestor do PROCON/MP, ele revelou o interesse de apresentar ao TJMG uma proposta de ação de interiorização do Programa às mais diversas comarcas de Minas Gerais.
Luiz Fernando Perez, economista e perito do Ministério Público, aprofundou a discussão acerca do conceito socioeconômico de superendividamento, dando enfoque à elaboração de planos de pagamento com envolvimento de vários credores e, ainda, levando em consideração a renda líquida do consumidor superendividado e o cuidado com o comprometimento de sua renda.
Na parte final do evento, os docentes puderam discutir detalhes apresentados nos painéis.
NIACON
Núcleo Integrado de Atendimento ao Consumidor (NIACON) funciona de segunda à sexta-feira, das 08h às 18h, no edifício Promotora de Justiça Iracema Tavares Dias Nardi, na rua Gonçalves Dias, n. 2.051, loja 2, no bairro Lourdes, em Belo Horizonte. No mesmo prédio fica o Procon-MG, órgão do MPMG.
Em 2022, Oficina do Núcleo Regional de Belo Horizonte, enfocou superendividamento
Em setembro de 2022, a EJEF já havia proporcionado a magistrados e assessores judiciais a “Oficina Jurídica Direito do consumidor e o superendividamento”, conduzida pelo Promotor de Justiça Glauber Tabagiba, pelo perito Luiz Fernando Perez e pelo Juiz coordenador do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSC) da capital, Clayton Rosa de Resende.
A Superintendente Adjunta da EJEF, Desembargadora Lílian Maciel, mediadora da oficina, abriu a atividade apresentando o documentário “No caminho do Superendividamento” , curta-metragem realizado pelo Instituto de Defesa do Consumidor (IDEC) e produzido pelo Coletivo Bodoque sobre os desafios do tratamento ao superendividado no Brasil. O filme conta a história de Rubens Adorno, um professor universitário que tem mais de 120% de sua renda mensal comprometida com o pagamento de créditos, em quatro bancos. A ideia era mostrar que o valor chocante da dívida não era matéria de pura ficção. Na época da produção, ano 2018, cerca de 30 milhões de pessoas estavam superendividadas no Brasil e 60 milhões, inadimplentes.
Com depoimentos de especialistas e consumidores, o documentário expõe o cenário problemático do crédito no país, em que falta regulação da oferta de crédito, do que resultam propagandas abusivas de instituições financeiras, e políticas públicas que representem uma luz no fim do túnel para encerrar o ciclo de dívidas.