Em atendimento à demanda do Programa de Atenção Integral ao Paciente Judiciário (PAI-PJ), a Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes (EJEF) promoveu, nesta sexta-feira, 30 de junho, oficina com o tema “A resolução n.º 487/23 do Conselho Nacional de Justiça e a política antimanicomial do Poder Judiciário”.
A ação educacional é destinada a desembargadores, juízes de direito, assessores, assistentes, servidores e estagiários de pós-graduação, preferencialmente atuantes no âmbito do processo penal e da execução das medidas de segurança.
A oficina lançou luz sobre a referida resolução, que determina a Política Antimanicomial do Poder Judiciário, estabelecendo orientações e diretrizes para a efetivação da Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência e da Lei n.º 10.216/2001 no contexto do processo penal e da execução das medidas de segurança.
O Juiz Luís Fernando Nigro Corrêa, Coordenador da Central de Execução de Medidas de Segurança 4.0 (CEMES) e docente do curso, destacou que a resolução amplia a atenção sobre como o processo penal da pessoa com transtorno mental deve ser conduzido: “Essa resolução trata de todos os aspectos relacionados a essa situação, desde a porta de entrada da justiça criminal até a execução da pena e da medida de segurança”.
Entre os procedimentos previstos para ocorrer durante todo o período de custódia, está o tratamento de saúde mental da pessoa detida ao longo do curso da execução da medida de segurança.
A Resolução n.º 487/2023 estabelece, entre os princípios e diretrizes que regem o tratamento das pessoas com transtorno mental no âmbito da jurisdição penal, a adoção da política no exato momento da execução da medida de segurança, a indicação de internação fundada exclusivamente em razões clínicas de saúde e a articulação interinstitucional permanente do poder Judiciário com as redes de atenção à saúde e socioassistenciais em todas as fases do procedimento penal.
Cláudio Schiavo, Juiz de Direito da comarca de Itambacuri, considera que todos os juízes que lidam com matéria penal e, sobretudo, com a execução penal, deveriam participar dessa formação. “Essa formação veio para nos atualizar sobre a maneira adequada de tratar a pessoa com transtorno mental no curso do processo penal. É bastante comum nos depararmos com pessoas nessa situação, e nem sempre a solução que adotamos é a melhor por falta de conhecimento ou atualização. Portanto, acredito que todos os juízes deveriam ter acesso a um conteúdo como o proposto aqui”, destacou.
Evoluções legal e histórico-social
O curso proporcionou uma imersão nas evoluções legais e histórico-sociais envolvendo o sofrimento mental, o paciente judiciário e, principalmente, no levantamento de questões atuais amparadas pelo princípio da dignidade. A tutela jurídica do tratamento atrelado à medida de segurança foi abordada, ressaltando-se a importância da regra decorrente da Lei 10.216/01, segundo a qual todo o tratamento deve ter como objetivo a reinserção social. Para tal, cuidou-se da importância de considerar as peculiaridades de cada paciente, com a formulação de um Projeto Terapêutico Singular (PTS) para todos os pacientes judiciários, a fim de garantir que os cuidados em saúde mental propiciem, por meio da atenção biopsicossocial, o retorno do paciente ao seu território.
Flávia Martins Pimentel, estagiária de pós-graduação em Direito, avaliou a oportunidade de aprender mais sobre o assunto como um momento único. “Agregou muito ao meu conhecimento, proporcionando uma visão totalmente diferente que altera todo o sistema de tratamento ao paciente judiciário. O curso trouxe aprofundamento legal e histórico ao contexto da deficiência psicossocial e ao sofrimento mental”, destacou.
Acompanhamento humanizado
O atendimento deverá ser feito e realizado com a adequação das intervenções médicas e assistenciais sinalizadas para cada pessoa pela Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), que é composta por serviços e equipamentos variados de atenção à saúde mental, tais como os Centros de Atenção Psicossocial (Caps), os Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT), os Centros de Convivência e Cultura, as Unidades de Acolhimento (UAs) e os leitos de atenção integral (em Hospitais Gerais e nos Caps III), presentes na Atenção Básica de Saúde, na Atenção Psicossocial Estratégica, nas urgências, na Atenção Hospitalar Geral, na estratégia de desinstitucionalização, como as Residências Terapêuticas, o Programa de Volta para Casa (PVC) e as estratégias de reabilitação psicossocial.
Audiência de custódia
A audiência de custódia foi um dos diversos assuntos tratados no curso. Conforme a Resolução nº 487/23, as diretrizes da política antimanicomial começam nas audiências de custódia, quando a autoridade judicial encaminhar para atendimento voluntário a pessoa com indícios de transtorno mental ou qualquer forma de deficiência psicossocial. A identificação deve ser feita por uma equipe médica e multidisciplinar qualificada, sendo ouvidos, ainda, o Ministério Público e a defesa da parte.
Se não for possível realizar a audiência de custódia, a autoridade judicial deve providenciar o registro, determinando a elaboração de um relatório médico e a requisição de informações às secretarias municipais ou estaduais sobre a condição da pessoa e a indicação de acompanhamento de saúde adequado.
No caso de a pessoa necessitar de tratamento de saúde mental durante a prisão processual ou outra medida cautelar, a autoridade reavaliará a necessidade e adequação de tais medidas aplicadas à pessoa presa ou solta, para o início ou continuidade do tratamento na Rede de Atendimento Psicossocial.
Em relação à sentença criminal que imponha medida de segurança, a Resolução prevê que a autoridade judicial determine a modalidade mais indicada ao tratamento de saúde da pessoa acusada, previamente ouvida e considerada a opinião da equipe médica e interdisciplinar, considerando a avaliação biopsicossocial, outros exames eventualmente realizados na fase de instrução e os cuidados a serem prestados em regime aberto. A norma estabelece, ainda, que a medida de tratamento ambulatorial seja priorizada e acompanhada pela autoridade judicial a partir de fluxos estabelecidos entre o Judiciário e a RAPS. Também deve avaliar a possibilidade, a amplitude e a necessidade da continuidade da medida de segurança, no mínimo, anualmente. Segundo a norma, a decisão não está condicionada ao término do tratamento de saúde mental.
PAI-PJ e Programa Novos Rumos
Em Minas Gerais, o Programa Novos Rumos na Execução Penal, vinculado ao PAI-PJ, atua desde 2001 para assessorar a justiça de 1ª e 2ª instâncias na individualização da aplicação e da execução da medida de segurança aos pacientes judiciários, por meio de proposições fundamentadas na aludida Lei 10.216/01 e na Resolução nº 487/23 do Conselho Nacional de Justiça, que instituiu a política antimanicomial do Poder Judiciário.
CEMES
Em março de 2022, foi instituída a Central de Execução de Medidas de Segurança 4.0 (CEMES) do Poder Judiciário do Estado de Minas Gerais, com sede em Belo Horizonte.
A Central coopera no processamento das execuções de medidas de segurança e seus incidentes, em tramitação em todas as unidades judiciárias da justiça comum de primeiro grau das Minas Gerais.