A noite desta terça-feira, 21 de março, foi dedicada a estudos sobre direito dos povos originários, com a realização da primeira aula síncrona do curso “Direitos Indígenas sob o enfoque da Justiça Estadual”. A ação educacional é fruto de parceria da Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes (EJEF) com a Terceira Vice-Presidência do TJMG e está credenciada pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira (ENFAM).
Na ocasião, Desembargador Paulo Calmon, membro do Comitê Técnico da EJEF, e Desembargadora Maria Luíza de Marilac, Coordenadora do Núcleo de Voluntariado do TJMG, juntamente com o Juiz Auxiliar da Terceira Vice-Presidência, Marcus Vinícius Mendes do Valle, abriram o evento saudando os magistrados e magistradas de 1ª e 2ª instâncias convocados para a ação.
Desembargadora Maria Luíza de Marilac destacou a importância do tema e das ações desenvolvidas para que o Judiciário atenda às demandas dos povos originários. “Essa ideia de ofertar um curso que demonstre as especificidades que envolvem o acesso à Justiça dessas comunidades indígenas é inovadora, pois o Judiciário ainda precisa vencer muitas barreiras para ser um instrumento de Justiça que alcance toda a sociedade”, ressaltou.
O curso tem como tutor o Juiz de Direito Matheus Moura, da Comarca de Águas Formosas, e como formador Rodrigo Arthuso, Professor Universitário e Indigenista Especializado da FUNAI.
Antes de iniciar a aula, Juiz Matheus Moura agradeceu à Terceira Vice-Presidência e ao Comitê PopRua/Jus, pela junção de esforços, ancorados nas iniciativas das Desembargadoras Ana Paula Nanetti Caixeta e Maria Luíza de Marilac, para que fosse criada a Comissão dos Direitos Indígenas sob a coordenação da Juíza Cláudia Helena Batista.
Ao iniciar a tutoria, o magistrado trouxe à luz os motivos pelos quais o curso foi desenvolvido e a justificativa do foco na Justiça estadual. “É importante registrar que o enfoque à população indígena, de acordo com os nossos estudos, é sempre pensado sob a jurisdição Federal e que o enfoque na jurisdição estadual passa desapercebido. Isso nos preocupou bastante quando assumimos a Comarca de Águas Formosas, porque a gente percebeu que há inúmeras competências processuais, pré-processuais, de cidadania que nos compete e que, muitas vezes, nós não temos capacitação e até mesmo ignoramos por completo esse papel, seja porque não sabemos, seja porque não nos é dado saber”, explicou.
O tutor norteou sua exposição dialogada com três indagações: Como identificar uma pessoa indígena? Há indígenas em Minas Gerais? A Justiça estadual é competente para julgar processos que envolvam pessoas ou comunidades indígenas?
Professor Rodrigo Arthuso abriu sua exposição ressaltando a alegria de contribuir com o curso e amplificar uma rede de atenção aos mais de 30.000 indígenas, de mais 20 etnias em Minas Gerais. “É uma oportunidade única de aproximação institucional do TJMG com as outras instituições que compõem o sistema de garantias de direitos dos Povos Indígenas”, destacou.
Curso
O curso iniciou-se no dia 16 de março e se encerrará em 9 de maio, após atividades síncronas e presenciais, incluindo o “Seminário Acesso à Justiça e Povos Indígenas: perspectivas práticas e institucionais’’, que ocorrerá no dia 27 de abril, no Auditório do Anexo I, em Belo Horizonte. A “Ação de Justiça Itinerante” será realizada nas comunidades maxacali, em Água Boa e Pradinho, em Águas Formosas, nos dias 29 e 30 de abril, levando comitivas de magistrados mineiros a atuarem no atendimento aos povos originários dessas regiões.
Projeto inspirador
O projeto desenvolvido há três anos na Comarca de Águas Formosas, denominado “Cidadania, Democracia e Justiça ao Povo Maxakali” e realizado pelo Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc), originou-se da observação do magistrado Matheus Matias, que, durante sua atuação, identificou que os indígenas da etnia maxakali enfrentavam dificuldades para se comunicar com agentes públicos e sofriam com invasões de suas terras, problemas de saúde e falta de apoio por parte do Estado. A percepção dessa realidade motivou o magistrado a buscar apoio do Tribunal de Justiça de Minas Gerais e do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais, e a estabelecer parcerias com outras instituições para promover a inclusão desses povos. O trabalho envolveu visitas às comunidades indígenas e adotou uma metodologia que considerou os modos de vida, práticas e valores dos maxakali.
Reconhecimento da OCDE
O Observatório da Inovação no Setor Público, da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), anunciou, em 15 de fevereiro, a seleção do projeto desenvolvido em Águas Formosas como um dos dez casos de inovação de destaque. A iniciativa foi a única do gênero no Brasil selecionada na categoria “Novos métodos para preservar identidades e robustecer a equidade”, juntamente com projetos da República de Singapura (Península Malaia, no Sudeste Asiático) e Bolonha (Itália).
A OCDE avaliou 1.084 propostas de 94 países. Após entrevista e defesa perante avaliadores da OCDE e do Centro de Inovação Pública dos Emirados Árabes Unidos Mohammed Bin Rashid, a relevância do projeto brasileiro foi reconhecida.